junho 27, 2004

O golpe de estado institucional

Eles sabem que trocar o Durão Barroso pelo Santana Lopes é um golpe de estado institucional. Os eleitores que porventura votaram no primeiro poderiam não eleger necesariamente o segundo. Se bem que a diferença entre um e o outro é a mesma que há entre a Pepsi e a Coca-Cola, a verdade é que dentro do partido do poder já há muita gente a tremer. E o Presidente da República também não anda nada contente. [RF]


Durão.


Pedro, o Usurpador, como diz o Bernabé…

O Comentário de TERESA DE SOUSA, no Público de hoje.


"O Povo Não Come Isso e Tem de Haver Eleições"

Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA / Público
27.6.2004

Da Feira da Ladra aos Restauradores, passando por Alfama e Rossio, apenas três pessoas manifestaram o seu contentamento na eventualidade de Pedro Santana Lopes vir a chefiar o Governo. "A seguir ao Durão é a pessoa mais inteligente. Quer dizer, ainda há o Louçã, mas esse é da esquerda e não pode ser". Carlos Rebelo, 58 anos, vendedor "ocasional" na Feira da Ladra, não tem dúvidas de que o presidente da câmara "é quem tem mais capacidade para tomar decisões". "Já reparou que ele fala sem papel à frente?".

Ali ao lado, um casal de feirantes puxa também do assunto, partilhando a simpatia por Santana Lopes. "Gosto bastante dele e estou de acordo que seja primeiro-ministro", diz Maximiano, 78 anos. A mulher concorda, mas faz um curioso reparo: "Tem um grande defeito: gosta muito de mulheres".

À sombrinha, um grupo de vendedoras olha para quem por ali deambula. Santana Lopes para primeiro-ministro? A pergunta suscita uma pequena discussão. Alguém "ousa" elogiar o "trabalho exemplar" do autarca, e acende-lhe um rastilho. "Exemplar em quê? Comigo ele não vai lá, nem com o leite que a minha mãe me deu!", irrita-se uma mulher.

As palavras dão azo a um pequeno ajuntamento de feirantes, que vão lançando improprérios contra Durão Barroso e Santana Lopes, à mistura com diversas alusões a Manuela Ferreira Leite e Leonor Beleza. "O povo não come isso e tem de haver eleições", aponta uma vendedora. "Está tudo abandalhado que não há ninguém competente para ir para lá", resmunga outra.

Descendo a rua do Paraíso, rumo a Alfama. Na pastelaria "Alfacinha", numa das principais artérias do bairro, as notícias que abriram os jornais televisivos, às 13h00, deixaram alguns clientes siderados na televisão. Santana Lopes já não recolhe muita simpatia naquela freguesia comunista e a notícia de que poderá vir a chefiar o Executivo fez torcer a boca a muita gente, como contou ao PÚBLICO Armando, 33 anos, empregado do café. "Não foi o povo que o elegeu, portanto há que antecipar as eleições", afirmou, esperançoso de que existam "pressões para o Presidente da República pedir eleições".

Num dos pequenos largos de Alfama, Carlos, 59 anos, começa por destilar a sua descrença na classe política, "essa cambada de parasitas", mas depois salienta que se Jorge Sampaio não convocar eleições "é uma desgraça para o povo". "Se não o fizer", frisa, "voltamos ao antigamente, quando se nomeava quem eles queriam".

Na praça de táxis do Rossio, os motoristas também comentaram o assunto durante a manhã de ontem, tendo concordado na posição de que "o povo é quem tem de decidir", sintetizou ao PÚBLICO um taxista. Próximo dali, Gabriel, 25 anos, dono de um quiosque de jornais, ouviu ao longo de toda a manhã os mesmos comentários. "As pessoas acham péssimo se não houver eleições porque elegeram o Durão e não o Santana", diz. "São duas pessoas completamente distintas", explica, acrescentando que "se Santana for para primeiro-ministro Cavaco Silva não se candidata ou se o fizer perde as eleições presidenciais".

Num momento em que os participantes da marcha do Orgulho Gay, ontem realizada, já começavam a dispersar-se pelo Rossio, Pedro Barros, 30 anos, refrescava-se numa das fontes da praça. "Santana Lopes não é a favor dos gays", disse, explicando que durante o desfile as pessoas que trocaram opiniões sobre o assunto defenderam a antecipação das legislativas. "Muitos disseram que preferiam Ferro Rodrigues para primeiro-ministro, mas pessoalmente eu preferiria João Soares".

Na estação de metro dos Restauradores, duas lojistas aceitaram fazer um pequeno jogo de associações. Santana Lopes: "É um 'bon vivant', falta-lhe seriedade e abandalha-se um bocadito". Durão Barroso: "É bom para a carreira dele ir para Bruxelas". Jorge Sampaio: "É uma pessoa muito sensata". Ferro Rodrigues: "Dá um bom primeiro-ministro". Manuela Ferreira Leite: "Credo!". Marcelo Rebelo de Sousa: "Gostamos muito e ouvimo-lo todas as semanas". Eleições antecipadas: "Transtorno".