janeiro 21, 2006

ARTUR RAMOS / O melhor amigo do meu pai

O meu irmão acaba de me dar a noticia da morte do Artur. Não acredito. Se não fosse o meu irmão a dizê-lo eu não acreditava. Foi o melhor amigo do meu pai. Era uma das minhas referencias intelectuais de juventude. Ir a casa do Artur, nas Águas Livres, foi sempre uma aventura para mim. A sua biblioteca, a sala, os amigos sempre reunidos ali à volta da mesa redonda, é algo que nunca esquecerei. O Artur foi sempre um homem que estava pendente das minhas viagens e quando voltava a Lisboa queria saber das minhas aventuras. Tinha muitas discussões com o meu pai. Recordo uma delas, no estacionamento em frente da casa dele no Estoril. Discutiam sobre alguém, não me lembro quem, mas lembro-me da resposta do Artur ao meu pai. “Não sejas parvo, meu cabrãozinho”. E olhou-me de imediato, como a pedir desculpa. Estás perdoado, Artur. [RF]

Foi o primeiro realizador efectivo da RTP, responsável pelas emissões experimentais da televisão estatal Bolseiro do Governo francês, era militante do Partido Comunista Português desde 1957.

O actor, encenador e realizador Artur Ramos morreu ontem em Lisboa. Contava 80 anos. O funeral realiza-se amanhã para o Cemitério do Alto São João, em Lisboa, saindo, às 11 horas, do centro funerário de São Pedro de Alcântara. O corpo de Artur Ramos estará hoje em câmara ardente, a partir das 14 horas.

Artur Ramos foi o primeiro realizador efectivo da RTP, depois de ter sido responsável pelas emissões experimentais na Feira Popular.

Na RTP dirigiu numerosas peças de autores como Tchecov, Carlos Selvagem, John Milligton Synge, Marivaux, Gervásio Lobato, Molière, Almeida Garrett, Gil Vicente, Calderón, Thorton Wilder, Oscar Wilde, Lope de Vega, Eugene O´Neill, Cervantes, Bernard Shaw, Mrozeck, Ribeiro Chiado, Luís de Sttau Monteiro, Alfredo Cortez, Marcel Pagnol, Miguel Rovisco, António Ferreira, entre outros.

A actriz Alina Vaz -que por ele foi dirigida na RTP na peça "O pedido de casamento" de Tchekov, com Rogério Paulo e Jacinto Ramos - salientou a "exigência profissional e a qualidade" do realizador.

"Destacou-se por uma apetência por textos literários e a divulgação de escritores através da televisão", disse ainda a actriz.

Como realizador assinou os filmes "Pássaros de Asas Cortadas", a partir de uma obra de Luiz Francisco Rebello, e "A Noite e a Madrugada", a partir de um original de Fernando Namora, de quem adaptou para RTP "Retalhos da Vida de um Médico".

Enquanto encenador, deve-se a estreia em Portugal de "Os dias felizes" de Samuel Beckett, com Glicínia Quartin.

Artur Ramos fundou duas companhias em Portugal, o grupo de Acção Teatral e a do Teatro Maria Matos. Foi crítico de teatro na "Seara Nova" e professor das escolas de teatro e cinema do Conservatório Nacional.

Artur Ramos nasceu em Lisboa, a 20 de Novembro de 1926, licenciou-se em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras de Lisboa.

Em Paris, onde viveu durante cinco anos, obteve uma bolsa do Governo francês para o Instituto de Altos Estudos Cinematográficos.

O ano passado foi homenageado pelo Festival de Teatro de Almada como "um homem de cultura, e uma personalidade humanista e tolerante, a quem devemos, todos os que trabalhamos no teatro, um exemplo de qualidade artística, de escrupulosa seriedade e de permanente energia", lia-se no programa da homenagem.

Aderiu ao Partido Comunista Português em 1957, onde, depois de 25 de Abril de 1974, foi dirigente do sector de artes e letras e do sector intelectual da Organização Regional de Lisboa. Foi, durante vários anos, colaborador da secção internacional do PCP. [Jornal de Noticias]