julho 09, 2004

Patriotas e Patrioteiros

Luís Filipe Scolari já é comendador, os jogadores da selecção portuguesa também, Jorge Sampaio já verteu uma furtiva lágrima pela nossa "desGrécia", José Barroso mandou lavar a "gravata" da sorte e as bandeiras que decoraram janelas e carros começam a ser recolhidas. O país parece voltar ao normal, aos poucos, e a crise política substituiu o futebol na abertura dos telejornais. Começa a haver clima, finalmente, para dizer uma ou duas coisas sobre os dias escaldantes do Euro-2004 sem ser acusado de ser "desmancha-prazeres".

Viram-se coisas lindas neste Euro. Mas viram-se e ouviram-se também nas rádios e nas televisões coisas que nos deviam fazer reflectir. Como é que se explica, por exemplo, a atitude de alguns jornalistas que rebentaram em palmas quando Scolari anunciou que ia renovar o contrato com a Federação Portuguesa de Futebol? Como se entende que tenha havido jornalistas que preferiram agradecer a Rui Costa a sua contribuição à selecção no momento em que este anunciou o abandono, em vez de lhe perguntarem se isso não representava antes uma chantagenzinha emocional em vésperas do jogo mais importante de sempre da equipa portuguesa? Anónimos de bandeira e cachecol à porta da academia de Alcochete merecem o nosso aplauso pelo amor à selecção. Agora jornalistas de bandeira e cachecol na bancada de imprensa merecem o que quê? O nosso respeito? A nossa admiração? Duvido. Há patriotas e patrioteiros.

Durante o Euro houve muitos jornalistas que não souberam fazer essa distinção. E o amor à Pátria não justifica tudo. Não justifica sequer que as televisões tenham, durante dias, tratado em notas de rodapé a crise política enquanto abriam os noticiários com imagens da tribo do futebol. Uma vez e outra e outra e outra, e outra quase até à náusea.

Rui Baptista/Publico